COMO UM ROMANCE
Foi
num desses dias chatos, que por incrível que parece, percebi que o mesmo amor
que tinha antes pela leitura ainda continua. E agradeço por isso. Tive que ir
assistir uma aula que seria ministrada pela professora Angélica. Devo confessar
que só fiquei para assisti-la porque sabia que seria ela. É impressionante como
ela sabe ler. Digo: saber ler não é reconhecer as palavras grafadas. Saber ler
é envolver. É sentir as palavras, é deixar-se levar por elas seja lá para onde
elas te queiram levar. E minha
professora sabia fazer isso muito bem. Ainda consigo me ver sentada naquela
carteira com os olhos fitos nos lábios de minha professora. Segurava meu
queixo. Era provável que se não fizesse isso, minha boca ficaria aberta. É tão
prazeroso ouvi-la ler. Creio que qualquer livro, qualquer texto lido por ela,
sendo chato ou não, torna-se agradabilíssimo quando declamados por seus lábios.
Enquanto
ela falava da disciplina, notei que segurava um livro aberto em alguma página
que ela marcava com um dos dedos de sua mão. Ela não esperou que perguntássemos
o porquê daquilo. Logo começou a explicar. Ela havia planejado começar a ler
para nós a partir da primeira página como é de costume por quase todos. Porém ela
começou a explicar por que passaria a ler daquela página. Falou-nos que certa
vez, há muito tempo, assistira a um filme e uma cena a chamou bastante atenção.
Uma personagem, ao ir devolver um livro para o bibliotecário, deixou-o cair. O livro
caíra aberto no chão e ela de imediato pôs a apanhá-lo e quando já o ia fechar
o bibliotecário interviu e disse-lhe para nunca rejeitar o que um livro tinha
para lhe dizer. Achei isso um máximo. Por vezes isso acontece comigo e por
muitas vezes ignorei o que alguns livros tinham para me dizer. Por causa dessa
cena, ela passou a nunca mais ignorar quando um livro se abria em determinada
página. Por isso ela leu exatamente o que estava escrito na página guardada por
seus dedos. E de fato aquele livro tinha algo a nos dizer. Fora as palavras
mais lindas que ouvi. Deixou-me com um desejo tão grande de lê-lo por completo
e de imediato. Quis tanto desvendar tudo que estava ali naquelas páginas só
aguardando alguém que fosse ousado o suficiente para abri-lo e ouvir o que
estava guardado naquelas folhas. Como um romance era seu nome. E como um
romance, desejei vivenciá-lo.
A.R.MORAES
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