quarta-feira, 12 de outubro de 2011

Imaginações no dia doze de outubro



Era dia das crianças e ela estava só, deitada em sua cama lendo um livro. Lia mecanicamente, pois seu interior pensava e pensava. Não tinha nenhuma criança para fazer valer a data. “dia das crianças!” repetia essas palavras. Contava vinte anos e percebeu que o instinto materno e familiar pesava-lhe na mente. Desejava de todo o coração estar deitada numa cama de casal abraçadinha com aquele que escolhera para passar os dias que Deus determinara-lhe. Desejava passar o dia das crianças abraçando as suas e distribuindo presentinhos que fariam alargar nos rostos dos pupilos seu prazer em recebê-los. Já havia pensado vagamente, quase que de forma indiferente, em construir sua família, mas nesse doze de outubro era diferente.
Desejava profundamente ter sua própria casinha, seu lar com um jardinzinho, um esposo para amá-lo e respeitá-lo e ao pronunciar essas palavras lembrou-se do juramento que as futuras esposas fazem quando, no altar, pedem a benção do boníssimo Pai. Sentia a felicidade erradicar em seu coração à medida que se imaginava. Pensou em seus filhos, sua casa, seu marido e os dias de felicidade e desejava muitíssimo com uma linda manhã em que ela um pouco preguiçosa, ainda estava abraçadinha com seu digníssimo esposo. Era como um conto de fadas. Imaginou toda sua vida familiar. O marido indo para o trabalho, ela cuidando das crianças e as arrumando para a escola. Depois de toda a labuta de casa partiria para o seu trabalho. Cuidaria de tudo com carrinho e pressa para, de volta à casa,  providenciar tudo para a chegada do esposo com seus filhinhos.
Lembrou-se dos feriados, bem como o dia das crianças em que ela e ele ficariam em casa curtindo seus filhos, brincando, comendo e assistindo filmes infantis, depois contariam uma historinha para as crianças, ou imaginou-se com seu esposo levando as crianças para um parque, um circo ou algo parecido, uma visita a um belo museu, a uma apresentação de pinturas em telas... Vinham em sua mente infinitas possibilidades. Queria isso, queria aquilo. Não queria lembrar-se das discussões com o marido, queria apenas lembrar-se das coisas boas que juntos poderiam fazer, embora ela soubesse que seria difícil não haverem brigas e mesmo sem querer imaginou-se discutindo com o marido e logo imaginou uma reconciliação tão amorosa e verdadeira, ela deitada em sua cama à espera do marido que fora colocar as crianças para dormir. Quando ele chegava ao pé da cama para deitar-se ela iniciava uma conversa, com pedidos de desculpas e tentava de qualquer forma ouvir da boca dele as desculpas também. E assim terminavam se amando como forma de conciliação para num próximo dia começarem sua vida de casados e pais felizes.
 Mas tudo aquilo não passava de cenas imaginadas em sua brilhante mente. Logo se dá conta de que era apenas um desejo e olhava para sua vida real, solteira aos vinte anos, morava só e tinha uma liberdade que não a sabia aproveitar... Passava mais tempo em casa lendo e escrevendo do que aproveitando com os amigos que sempre a intimavam a comparecer e ela como uma culpada não comparecia.  
Tentou sair do lago em que se afogara em pensamentos, tentou concentrar-se no livro que já havia passado paginas e mais paginas, mas não sabia o que lera. Quis retorná-las, mas preferiu deixá-lo de lado. Pegou apenas seu celular, colocou umas belas musicas e os fones em seus ouvidos; aumentou o som no volume máximo. Ficou a ouvir as musicas e embriagou-se em seus pensamentos sobre a vida maternal e de mulher casada e feliz, ao mesmo tempo em que a contrastava com a vida de solteira que levava. Já não sabia qual era a melhor. Claro que não havia experiênciado a vida de casada, só em sua fértil imaginação. Achava que o que precisava mesmo era sair daquele estado de nostalgia e divertir-se um pouco.  “Do que lhe adiantara uma vida de solteira e com toda a liberdade que tinha se não a sabia aproveitar?” Antes ter uma família, uma razão de viver, alguém para dedicar sua existência e assim ficou tanto a pensar, a imaginar sua vida, seus desejos e necessidades que dormira. 

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