terça-feira, 21 de fevereiro de 2012

Fuga da Realidade


Era tarde, por volta das 15 horas, e ela estava lendo um livro. Se a perguntassem que livro estava lendo, qual o assunto abordado ela não saberia responder, pois lia apenas mecanicamente. De repente começou a relembrar aquela cena. Aquela cena que nunca iria esquecer.
Ela, no sofá, lendo as últimas notícias da cidade e ele sentado à mesa tentando terminar um trabalho que parecia não ter fim. Ela suspirava, já havia lido o jornal umas três vezes. Ora intercalava sua atenção nas notícias, ora nele estressado e irritado com o tal trabalho. Lá fora uma negra nuvem cobria a cidade e ventos fortes movimentavam as arvores na entrada da casa, fazendo roçarem as folhas na janela. Ela mais uma vez suspirara e tornou a olhar para ele. Começou a chover e só em imaginar as gotas de água caindo sentiu um arrepio em seu corpo e tornou a olhar para ele.
Irritado como estava, ela não ousava pronunciar uma sequer palavrinha em sua direção. Fingindo, ainda, ler o jornal; encolheu-se no sofá; sentada, praticamente, sobre as pernas. Ele já não aguentava mais, desejava deixar aquele trabalho de lado, ora por ora parava de digitar seja lá o que estava digitando e passava as mãos pela cabeça, roçava os olhos com as mãos, fechava-os e os abria de vez em quando e por um instante olhou para ela encolhida no sofá lendo aquele jornal interminável. Depois fixou seu olhar na janela, observou as gotas caindo lá fora e sentiu um friozinho. Aquele tempo fechado convidava a deitar, a ficar quieto enrolado no cobertor ou...
Bem... Ele nem queria pensar! Tornou a olhar para o monitor e a digitar. Ela não havia percebido essa pausa que ele fizera, tão pouco que ele a olhara.  Hesitou em levantar-se e ir para seu quarto; deixá-lo ali com seu trabalho. Mas com um gesto brusco, que o fez parar de digitar e se voltar para Ela, largou o jornal no chão e dirigindo-se até ele pronunciou as seguintes palavras:
“Dane-se esse trabalho!”
Aproximou-se dele, que ainda estava sentado olhando-a incrédulo, e girou a cadeira de forma que ela ficasse encarando-o. Sentou-se em suas pernas e o beijou de forma, quase que, faminta e o intimou a correspondê-la. Ele nada pode fazer a não ser corresponder. Desejava aquela mulher e tudo que ele queria estava ali, preso a ele, lábios contra lábios, cochas contra cochas.
Ele levantou-se com ela ainda em seus braços e dirigiu-se para aquele mesmo sofá, que minutos antes ela estava a suspirar. Beijava-a loucamente como se fosse o ultimo beijo de sua vida, abraçava-a e sentia o perfume que transbordava de seu corpo. Disse para si mesmo: “Dane-se o trabalho!”.
Deitou-a no sofá e... Continuou suas caricias e a amou ali mesmo, em uma tarde coberta por aquela nuvem negra que fazia cair a água mais gelada que seus corpos poderiam imaginar.
Não quiseram de mais nada saber, nem jornal, nem trabalho. Tudo que importava era aquele restante de tarde em que estavam ali, agarradinhos, se amando, se aquecendo e curtindo o barulho que a chuva fazia lá fora. Era como se aquela chuva vibrasse pela vitoria de ambos e ela pensou: “Se a mulher não ousar; perde muitos prazeres na vida!”. Provara ela que tal frase era a mais pura verdade e ria silenciosamente ao abraçá-lo, ao beijá-lo no pescoço e sentia-se completa e maravilhada com tamanha façanha.  
Trim. Trim.
Alguém na porta a chamava. Ela acordou de sua lembrança. Balançou a cabeça e percebeu que já estava na metade do livro e não sabia o que lera. Ficou tão presa a tal lembrança de um momento que nunca acontecera, mas sim de uma lembrança que ela desejava que um dia fosse acontecer.  Balançou a cabeça e foi atender a porta. Tinha que parar com esses devaneios, com esses momentos de pura fuga de sua realidade. Pensava em quanto se dirigia à porta.

 A.R.MORAES

sábado, 18 de fevereiro de 2012

Para não esquecer



Estava encostada na janela e olhava as nuvens que se preparavam para deixar cair gotas de água sobre o solo que ela se encontrava. O dia começava a tornar-se noite. E ela começou a lembrar de seu passado. Ao lembrar-se dos bons momentos, se mal dizia por ter tornado-se adulta.  Lembrou-se das brincadeiras com os irmãos e vizinhos quando a chuva caia, de nada tinha medo. Corria na chuva, brincava do pega-pega, do se esconde... Mas do que mais gostava era de fazer barquinhos de folha de caderno e soltar nas pequenas correntezas que a água fazia no solo. Parecia real. Era como se ela estivesse mesmo dentro do barquinho navegando por mares nunca dantes navegados. Imaginava as mais belas aventuras e até apostava, com os irmãos e amigos, que seu barquinho de papel seria o último a afundar.
Os trovões e raios não assustavam; doenças também não a faziam temer. E o frio... Ah o frio... Era maravilhoso. E hoje, já adulta, tudo era diferente. Passou a correr, não para a chuva, mas para longe dela, como se ela fosse a morte. Passou a se esconder dentro de casa, na cama, debaixo dos cobertores como se uma gota fosse lhe causar um grande dano. E tudo era motivo de resfriado, de doenças. Pensava que se caísse na chuva os vizinhos a chamariam de doida, sem noção...
Fechou os olhos e ficou a imaginar os bons tempos que não voltam mais. Quis por um momento repetir as mesmas coisas que fazia quando ainda era criança e não se importava com que os outros iriam dizer... se ficaria doente ou não. Percebeu que ser adulta era ser fraca e não gostava da ideia de ser fraca.
A chuva já caia forte e bela. Mais parecia um chamado à aventura. Mas ela era fraca, era adulta. Não agira mais por emoção, tudo era decidido por meio da razão e ela sentiu raiva disso. Ao longe viu algumas crianças repetirem o mesmo que ela fazia, há anos atrás. E por um momento quase foi se juntar a eles, mas o medo e a razão a impedira de realizar seu desejo. Agonizava-se, pois a chuva já estava passando e com ela sua oportunidade de tornar a ser criança. Olhou para as casas dos vizinhos e percebeu que todos estavam trancafiados em suas residências, com medo de uma das mais belas obras de Deus.
Decidira. Iria sim cair na chuva. Rasgou uma folha de seu caderno e fez um barquinho semelhante ao de quando era criança. Suas mãos já não eram tão hábeis, mas ficou feliz por não ter esquecido como fazê-lo. Abriu a porta e desconfiadamente saiu na tentativa de soltar seu barquinho e correr atrás dele até onde fosse possível. Sentiu um frio arrepiar-lhe o corpo, quase desistiu, mas continuou firme em sua decisão. Sentiu as gostas caírem sobre sua cabeça. Ergueu o rosto e pode sentir uma caricia da chuva que parecia agradecer por ela ter tornado a ser criança. Viu-se como nos anos passados. Rodopiava de braços abertos, olhos fechados e rosto erguido ao céu. Agradecia, silenciosamente, por aquele momento. Correu e logo à frente encontrou uma maravilhosa correnteza e soltou seu barquinho que já estava bem molhado. Seguiu até onde não pode mais. Deixou-o ir e com ele todas as suas lembranças de quando era criança. Retornou. Com um sorriso alargando seu rosto olhou mais uma vez para o céu e deixou que a chuva acariciasse seu rosto mais uma vez. Sentiu-se bem.


terça-feira, 7 de fevereiro de 2012

Um instante



Os dias passam tão depressa...
Confusões de pensamentos pairam sobre meu ser.
Turbilhões de imagens passam em minha frente.

Uma canção, meus ouvidos sentem.                                                          
São as batidas do meu coração,
Que ora acelera, ora quase não se sabe que ainda bate.

Sol que arde e faz sentir que ainda vive.
Chuva que molha e ameniza, suaviza...
Vento que sopra onde antes foi ferido,
Terra que piso e apoio sinto.

Vida tão bela e passageira.
Vida feita de momentos.
Vida bela...
Vida que vivo.

domingo, 5 de fevereiro de 2012

Um breve lembrar

Ao longe um som ...
E com ele uma lembrança,
Um cheiro de terra molhada,
E uma lagrima que corta meu rosto.

É a saudade ...
Amarga e cruel que fere a alma
Que faz querer voltar o tempo,
Mas se contenta em ter ao menos ... O que lembrar!!!




sábado, 12 de novembro de 2011

Há tanto o que escrever



Tenho tanto o que escrever que já nem sei por onde começar. Escrever é a única forma de me despersonalizar. Antes de começar a mover a ponta dos dedos pelo teclado sinto-me cheia, cheia de historias, cheia de personagens, que ficam pulsando no meu peito, ansiosas por vir ao mundo; por vir às folhas. Querem ter sua própria vida. As letras são o único modo de dar corpo às historias, aos personagens. Chego a ficar ofegante e quero escrever tudo de uma única vez, tarefa difícil, pois não é o mesmo que falar... Tenho tanto o que escrever, tenho o tanto que viver e é na escrita que vivo, é na escrita que ponho tudo que está aqui dentro para fora. As saudades, as tristeza, os sonhos... Ah! Os sonhos... O que seria de mim sem eles? O que seria de mim sem as palavras? Chega a ser impressionantemente assustador a capacidade de uma pequena letrinha se unindo a outra formando um corpo, um belo corpo. Corpo não só porque se vê o exterior, mas também pelo interior de cada palavra formada, o segredo que cada uma esconde e que só aquele que a admira e usa sabe encontrá-lo. O significado. Sim! o significado que cada uma carrega. O significado atribuído. Antes da forma o segredo. Antes da forma o sentido. Ah! Letra, letra, letra... Exemplo perfeito de que a união é forte. É belo. Sim! muito belo o formato que vai assumindo.  
Paro e olho o formato que já assumiu. Percebo que ate então era só um emaranhado de letras soltas em meu peito pulsante e agora vai assumindo seu formato; vão tendo sua própria vida. Fico a olhá-las. É como um tecer, é como construir um crochê, vai-se unindo os pequenos pontinhos e quando se dá por si tem-se uma bela toalha toda trabalhada com maior carinho e amor de quem a sabe fazer. Então você olha e se regozija com seu trabalho. Percebe que acabou de dá luz, percebe que acabou de dá vida, e então ousa se assemelhar a Deus, pois foi capaz de criar. Talvez seja isso mesmo que signifique imagem e semelhança. Então você fica contente e quer mais e mais e quando percebe já não tem freios, já não consegue parar. Por isso torna-se a sua vida, porque percebe que é isso que sabe fazer. Porque é isso que quer fazer, dá vida, liberar as criaturas desconhecidas que se encontram dentro do teu peito. Percebe que é na escrita que até o imperfeito é perfeito e isso é maravilhoso. Havia tanto o que escrever, mas preferi escrever sobre o escrever. Há ainda tanto o que escrever; tanto o que viver!

segunda-feira, 7 de novembro de 2011

Vida louca vida

 Sem mais nem porque estava sentada ao pé da parede ouvindo vida louca vida do Cazuza. Começou a pensar em sua vida que nada tinha de louca, mas de parada. Sim! Parada. Imaginava onde devia ter deixado toda a ação de sua vida. Toda a adrenalina, todo o sentido... Quis dar uma volta em seu passado para tentar resgatar toda a importância de sua vida. Não tinha uma máquina do tempo, mas tinha uma imaginação e uma lembrança que se assemelhava a uma e logo se pôs a voltear seu passado na tentativa de resgatar a razão do seu viver.
Visitou sua infância e quase ficou por lá, não fosse um episódio desagradável, percebeu que não conseguia fazer com que a entendessem. Visitou sua pré-adolescência, gostou, ficou uns dias por lá... Mas percebeu que sua voz não tinha vez. Então decidiu ir até sua adolescência, essa quase passou direto, mas lembrou-se do que chamavam rebeldia e quis saboreá-la mais uma vez. O ápice da vida em que se sentia dona do mundo, em que se sentia com toda a razão. Percebeu que era apenas rebeldia e não conseguia mais uma vez fazer com que a entendessem.
Eis que chegou ao inicio do que chamavam fase adulta. Transição da fase rebelde para aquela de tentativa de ser responsável. Mas essa era ainda mais difícil. Queria ainda ser adolescente, curtir a vida com toda a liberdade possível, muitos ficam presos nessa fase. Confundia-se muito, ainda era adolescente ou já amadurecera? Ficou por um tempo nessa de não saber o que era, mas logo passou à fase adulta propriamente dita. Essa foi a de responsabilidade ao extremo, já não fazia por si, mas por outros. E às vezes se aborrecia e aborrecia os demais. Dizia não ter sido preparada para tal fase. Mas era ali que se encontrava. Volteou todo seu passado e percebeu que nunca fora compreendida e que provavelmente nunca irá fazer com que a compreendam. Seria mesmo necessário que os outros a compreendessem ou seria ela que devia se entender, se compreender primeiro?!

sábado, 5 de novembro de 2011

FORTE CHUVA DE FINAL DE TARDE

Impressionava-se com o vazio que enchia sua alma sob a forte chuva de final de tarde; aquela tarde escura pesava-lhe sobre os ombros; era como se tivesse que carregá-la para o resto de sua vida e isso a torturava. O vento batia forte em seu corpo e as gotas caiam como se quisessem machucá-la. Olhava para todos os lados e não via uma saída, não via para onde fugir. Fechava os olhos ao notar que raios enfeitavam o céu e como se adivinhasse o que iria acontecer, tapava os ouvidos prevendo um forte estrondo, que viria a ser um trovão, mas para ela mais parecia uma reclamação Daquele lá de cima. Pensou logo no que poderia ter feito de errado e pôs-se a pedir desculpas. Agora todas as forças da natureza revoltada, sabia-se lá porque ou por quem, descontava toda sua fúria nela; nela que naquele momento era a preza mais fácil e sem defesa. Quis gritar; quis correr; quis sumir, mas era impossível, pois as saídas pareciam não existir.
Tão preocupada com a forte chuva, que mais parecia uma tempestade, esquecera de interrogar-se como havia ido parar ali e onde era aquele ali? Mudara. Já não era aquela do inicio de alma vazia, mas agora era aquela de alma cheia de inquietações. O que antes era escuro; agora era treva, já nem os raios iluminavam seu caminho; já não ouvia o estrondo e tudo parecia sumir a sua volta, menos o forte vento e as fortes gostas que caíam sobre seu corpo frágil e sem proteção. Girava, girava, girava. Tentava abrir os olhos na esperança de ver uma saída, mas os olhos já estavam abertos e nada via ao seu redor. Era como se tivesse perdido a audição, a visão, o olfato; tristemente ainda restava-lhe o tato que fazia sentir o peso violento das gostas e o forte frio que o vento soprava.
Onde, por que e para que estava ali? Já quase enlouquecida tornou a girar e ao tentar encontrar uma solução para aquela tempestade em que se encontrava caiu e apagou...
...
...
...
Abriu os olhos e sua visão tornou. Já não era treva e sim luz, já não era uma tarde de forte chuva, mas uma manhã de belo sol. Já não era trovão e sim belos pássaros cantando como se festejassem sua vitória. Percebera que nunca houve tempestade alguma, que nunca tinha saído de sua cama. Não era revolta da natureza; era inquietação de sua alma.